"O Diário de Anne Frank" me surpreendeu de diversas maneiras. Antes de lê-lo, havia ouvido alguma coisa sobre ele aqui e ali, durante toda a minha vida. Mas nada que possa ser comparado às experiências que o leitura do livro me proporcionou.
A obra trata sobre a permanência das famílias Frank, Van Pels e do dentista Fritz Pfeffer, todos judeus, em um esconderijo na Holanda, na ocasião da Segunda Guerra Mundial.
Porém, mais do que isso, a inteligente e notável adolescente Anne traz ao leitor as suas angústias, a sua chegada à adolescência, seus conflitos com os indivíduos do esconderijo, suas primeiras paixões, sua perspicaz visão em relação à guerra, dentre outros assuntos.
No diário, é possível conhecer de verdade a pessoa Anne Frank, que sonhava em se tornar uma escritora; que queria ser notada, amada e respeitada; que tornou-se adulta precocemente, diante das trágicas circunstâncias.
Enquanto escritor e professor de Língua Portuguesa, achei bem interessante o fato de que ela não escrevia para si mesma, como qualquer outra adolescente faria. Anne inventou uma personagem, Kitty, e, escrevendo cartas para Kitty, elaborou o seu diário. Isso é um conhecimento (ou uma intuição) fantástico para uma menina da idade dela: sempre imaginar o público-alvo, o leitor, no momento de escrever qualquer coisa.
Além disso, por vezes a argumentação de Anne foi tão consciente, tão pronta, tão madura, que eu imaginava estar lendo um romance de alguma autora renomada, e não o diário de uma garota de 13, 14, 15 anos.
E, para finalizar, enquanto leitor, o livro mexeu comigo profundamente, pois, apesar da situação horrível que estava vivendo, Anne manteve-se esperançosa, viva (muito viva), cheia de projetos para "depois da guerra". Contudo, de repente, três ou quatro dias após a não-planejada derradeira "carta" para Kitty, ela e os outros foram encontrados. Por conta disso, há no livro o relato de alguém, talvez de seu pai Otto Frank, o único sobrevivente, dizendo o que havia acontecido com os oito seres humanos que estavam escondidos. E é chocante porque, quando assistimos aos terríveis e inacreditáveis vídeos reais dos campos de concentração nazistas, até custamos a acreditar que aquilo tinha ocorrido, que aquelas criaturas encontradas nos campos após a libertação eram realmente pessoas (https://www.youtube.com/watch?v=QDt8So601DA). Agora, entrando em contato com uma jovem tão cheia de vida naqueles textos e sabendo, em seguida, que pouquíssimo tempo depois ela foi assassinada por conta do tifo e da situação precária dos campos, tendo sido, na sequência, jogada pelada em uma vala comum, como um boneco imprestável, isso dá outra perspectiva, alça o leitor a um outro patamar de terror, de pena, de desespero, de todas as sensações horríveis que se possa sentir.